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Foto do escritorAndréa Luiza da Silveira

Ansiedade, aceleramento e exigências no trabalho

Atualizado: 30 de abr.



A ansiedade também é uma relação com a temporalidade vivida. Podemos observar isso na relação que se costuma estabelecer com o futuro em que o cenário imaginado é constituído como catastrófico. A vivência é de que tudo dará errado, será sofrido etc. Assim, a inviabilização da realização daquilo que se deseja é experimentada como certa. Nesta experimentação é que ocorrem o aperto no peito, tremores, suores, insegurança e tristeza.

Estas breves linhas destacam apenas um aspecto sobre a ansiedade. Haverá especificidades de uma situação que é sempre singular. E partindo da singularidade de cada condição psicológica iremos compreender e atuar no contexto psicoterapêutico. É possível, tratando-se do conhecimento e fazer científicos, fazermos algumas generalizações. Neste sentido que podemos analisar a ocorrência do aceleramento no trabalho relacionado as exigências impostas por metas a serem atingidas.

Nestes dias eu estava assistindo uma série coreana com o único intuito de distrair-me. Era bem bobinha, a princípio. Mas, ao longo da trama vai aparecendo o trabalho da protagonista e de suas duas amigas. Uma delas trabalha numa loja. Foi prometido uma viajem de prêmio para a equipe bater a meta de vendas, para isso, não teriam folga, nem para ir ao banheiro e fariam hora extra. Depois que bateram a meta, além de não ganharem a viagem prometida a meta foi aumentada e o aceleramento, isto é, trabalhar sem parar durante longas horas, tornou-se naturalizado. A consequência psicológica, que aparece na série, foi o esgotamento, a vivência da injustiça e o recurso ao álcool para relaxar. É bastante comum, não é mesmo?

Podemos refletir sobre a ansiedade e nosso período histórico e social e a relação que temos com o trabalho. Parece natural que tenhamos que trabalhar sem parar. Mas não é natural, é um fenômeno histórico. Surge, deste modo, como fenômeno singular, o aceleramento, isto é, um ritmo de trabalho intenso. E com o aceleramento também se associam fenômenos psicológicos e psicopatológicos, como a ansiedade, o estresse, o Burnout e o esgotamento.

A ligação com nosso período histórico e social é justamente a forma como as metas são estabelecidas. O aceleramento é um fenômeno que pode ser observado em qualquer tipo de atividade seja no setor industrial ou de serviços. Trata-se da diminuição drástica ou até mesmo a exclusão do tempo morto de trabalho, aqueles momentos de ida ao banheiro, beber alguma coisa, uma conversa sobre trabalho ou outro assunto qualquer etc.

Há uma diferença importante entre exigências e metas. As exigências toda carreira e todas as atividades terão. A psicóloga clínica, por exemplo, durante os atendimentos, comumente ficará sentada. Se atende durante 4h, ficará sentada neste período. Portanto é uma exigência. Uma professora atualiza-se para dar aulas, então, a leitura será uma exigência. A meta também é uma exigência, um mestrando poderá estabelecer para si mesmo um número de parágrafos escritos por dia ou um número de páginas lidas. Mas a meta pode ser imposta de tal forma que a pessoa que trabalha deverá realizar uma atividade e obter um resultado determinado, que, em geral, é quantitativo. Para atender a esta meta alta será necessário trabalhar mais rápido, fazendo várias atividades ao mesmo tempo.

Vejamos o caso de quem trabalha com suporte técnico por atendimentos telefônicos, whatsapp e email. Caso o número de atendentes não dê conta da demanda dos clientes o aceleramento será necessário para atender as necessidades dos clientes que reclamarão da demora. O atendente que precisa concentrar-se para auxiliar o(a) cliente na resolução de seu problema preocupa-se com a fila de espera e, por fim, tem dificuldade de concentrar-se. Faz os atendimentos cada vez mais rapidamente, não bebe água, não faz seu lanche ou não almoça, não vai ao banheiro, não conversa. O aceleramento e o não cumprimento da meta o(a) faz dizer a si mesmo que é incompetente. Este combo de inconformidades poderá levar ao estresse, ao esgotamento e a experimentação da ansiedade. Como lidar com isto?

Inicialmente, não acelere no trabalho. O aceleramento não é sinônimo de alto desempenho ou competência, ao contrário, é uma inconformidade porque gera sofrimento e doenças. O estabelecimento de metas que não são possíveis de atingir é um erro de gestão, portanto, é necessário que a meta seja alinhada ao número de pessoas e ao tempo para realizar as atividades e a condição e os recursos que as pessoas têm de atingi-las.

A ansiedade, mesmo vivida fora do trabalho, pode estar sendo sustentada pelas relações de trabalho. Neste caso, procure auxílio profissional de um(a) psicológico(a) para poder identificá-la e superá-la.

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