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Foto do escritorAndréa Luiza da Silveira

A entrevista na psicoterapia

Atualizado: 13 de abr.

Os temas desse ano aqui no blog Psicologia em 3 minutos versam muito mais sobre a metodologia empregada na psicoterapia. Ultimamente meus pensamentos e leituras estão bastante voltados a essa questão. A situação é um conceito que mobilizamos na entrevista clínica. Devo, então, esclarecer, inicialmente, o que é uma entrevista na psicoterapia, e, não menos importante, diferenciar a entrevista em que a descrição de uma situação é desenvolvida, marcando os diferentes objetivos.

Noto que a entrevista ocorre como uma conversa, muito embora eu tenha objetivos claros nas sessões, o que geralmente deixo explícito para os(as) clientes. Entendo, ao refletir sobre minha prática clínica, que sou eu quem emprega o tom de conversa. Por isso não me espanta quando um(a) cliente diz algo como "hoje consegui conversar com você. Como é bom conversar com você Andréa". Nesta mesma apreciação dele(a) está implícito que houve situações no contexto psicoterapêutico que talvez não tenha conseguido conversar, por que a pessoa chorou muito, não conseguia narrar sobre aquilo que vivia. Afinal, nem sempre se encontram as palavras para dizer o que se quer. E nós psicoterapeutas trabalhamos por meio das palavras, é certo, mas também com acolhimento. As perguntas servem para viabilizar a reflexão para que as experiências possam ser conhecidas e expressas em palavras. A interrogação, ao ser apropriada como objeto de reflexão, será exposta pela própria pessoa em outra sessão. Será elaborada, negada, confirmada ou contextualizada.

Um processo psicoterapêutico costuma ser longo e num ritmo que depende, em grande medida do engajamento do(a) cliente, como por exemplo, a condição de manter a frequência das sessões psicoterapêuticas de acordo com sua necessidade. Mas inicia-se, invariavelmente, com a primeira sessão. Neste momento, as pessoas costumam explanar sobre seus motivos para desejarem iniciar sua psicoterapia, o que encorajo. Isso não quer dizer que as pessoas falem tudo sobre sua historicidade, suas dores e desejos, ao contrário, geralmente o que é mais sofrido pode levar muitas sessões para ser revelado, pois envolve pessoas muito amadas e muitas contradições e conflitos... Porém, partimos do que é exposto na primeira sessão, o que costuma ser um bom ponto. Meu posicionamento como psicoterapeuta é ativo, neste sentido, considero que além de encorajar é importante formular questões que são deveras específicas àquela história, àquela narrativa, àquela experiência, isto é, sem roteiro. Mas isto não significa sem guia. A compreensão sobre a teoria e sua operacionalidade na entrevista é o guia. Bem, trata-se de que numa conversa pessoal certas interrogações poderiam ser invasivas e indiscretas. Entretanto, como disse-me um(a) cliente estes dias "não me importo que você pergunte, faço questão de dizer tudo porque sei que toda informação é preciosa e poderá me ajudar". Esse resposta que me foi dada resultou de minha conduta interrogativa "você está confortável em falar sobre isso, você quer ou sente que precisa falar sobre isso mesmo não sendo confortável?" Respostas possíveis: sim, não agora, nunca, talvez algum dia, nunca mais agendar uma sessão com você.

A interrogação é uma conduta humana que viabiliza conhecer e a entrevista no campo clínico, especialmente numa psicoterapia, é uma conduta profissional. Quando interrogo meu(minha) cliente a minha interrogação poderá tornar-se a interrogação da própria pessoa sobre algo que ela também não conhece. Ouço muito algo parecido com "não pensei sobre isso ainda. É algo para refletir...". A interrogação compõe também outras técnicas além da entrevista e fundamenta, de certa forma, a teoria da técnica. Questão sobre a qual não aprofundaremos no espaço deste blog. Apenas penso que importa sinalizar que as perguntas que objetivam certa totalização sobre um entendimento de ser ou uma localização diante de uma situação ou vivência implicam, em geral, descrições de situações diversas em que o mesmo fenômeno ocorre, por exemplo, a ansiedade, a raiva ou o ciúme etc. ou até mesmo a mesma situação numa perspectiva nova construída no processo psicoterapêutico.

A entrevista cujo objetivo é a descrição de uma situação, a meu ver, torna-se mais densa, precisa e detalhada. Afirmo a partir da minha experiência como psicoterapeuta que os objetivos da entrevista que visa a descrição de uma situação são: compreender um fenômeno psíquico contextualizado precisando a temporalidade, a corporeidade e os valores; completar a descrição que ficou incompleta – afinal as pessoas querem ou precisam falar de outras coisas enquanto observamos que a descrição daquela situação específica é necessária e ela ainda não; viabilizar a compreensão da pessoa diante de sua situação recorrendo a historicidade daquele fenômeno, e por fim; a localização de suas possibilidades. Vejam que tais objetivos constituem o meu horizonte reflexivo para a orientar-me enquanto pergunto. Devem ser, oportunamente, explicados para o(a) cliente e assim faço a verificação psicoterapêutica, interrogo a mim mesma "essa questão, essa descrição faz sentido para essa pessoa?". A localização ocorre dialeticamente, num movimento que vai do progressivo da historicidade até regressivo do fenômeno psíquico, ao mesmo tempo em que, na própria sessão estamos ali, eu e meu(minha) cliente, diante um(a) do(a) outro(a) e somente ele ou ela poderá dizer-me se faz sentido para ela e em que medida.

O conceito de situação comporta toda materialidade, temporalidade e o clima afetivo em torno da pessoa e seus próprios valores. Por isso, ao descrever a condição psicológica, interrogamos onde, quando e como estava se sentindo em relação a si mesmo(a), a outros pessoas (presentes ou ausentes) ou alguma coisa que estava ocorrendo, alguma expectativa sobre algum acontecimento ou lembrança. Todas estas noções são mobilizadas na entrevista clínica no contexto psicoterapêutico.



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