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Foto do escritorAndréa Luiza da Silveira

Do cansaço a exaustão pelo trabalho


O grito, quadro de  Edvard Munch, 1893

É bastante comum que as pessoas não percebam o quanto seus problemas estão relacionados a sua situação de trabalho e de que outras pessoas no trabalho podem estar igualmente vivenciando certo sofrimento. O trabalho, por motivos diversos que dependem da história de cada pessoa e da sociedade, constitui-se como central mediando positivamente as relações familiares, a relação amorosa, o lazer, os estudos e as amizades. No entanto, pode prejudicá-las quando as vivências no trabalho não são satisfatórias, somadas a problemas e as exigências de várias ordens (relações pessoais e profissionais, horas de trabalho, responsabilidades não previstas no contrato de trabalho etc.) que o trabalhador não consegue suprir. Então, origina-se aos poucos o cansaço, o desconforto e o desanimo.

As dificuldades e realizações ligadas ao trabalho interferem nos demais contextos de vida. A fadiga, segundo testemunhos que ouvimos e lemos inicia devagar, como por exemplo, acordar ainda sentindo-se cansado (a). No entanto, a experiência de cansaço progride para não conseguir dormir ou acordar no meio da noite sem voltar a dormir, preocupar-se ou sonhar com dificuldades e problemas no trabalho, perder a vontade de fazer as coisas etc. Isto quer dizer que uma noite de sono não é suficiente para repor as energias e, também, em muitos casos, que a noite de sono não é contínua. E a continuidade do sono é importante pois terá implicações em como nos sentiremos ao longo do dia. Mas, por que as pessoas ficam tão cansadas por causa do seu trabalho? E como esse cansaço inicial ao progredir decorre também em problemas psicológicos?

São muitas as variáveis a serem discutidas para responder a estas perguntas. Por um lado, temos as condições sociais que definem o modo de vida, tais como as condições de moradia, de ida e volta ao trabalho, de alimentação etc. E, por outro lado, temos as condições de trabalho, tais como o ritmo de trabalho, a jornada de trabalho, as exigências de trabalho, os intervalos e pausas necessárias ao longo da jornada de trabalho, as relações humanas no trabalho, entre outras mais específicas concernentes as peculiaridades de cada atividade.

As experiências individuais de cansaço, fadiga ou exaustão geradas pelo trabalho são muito variadas, pois dependem do tipo de atividade profissional que se realiza. Com efeito, de modo geral, estão diretamente relacionadas a uma série de exigências do trabalho que normalmente compõe as queixas reveladas no espaço da clínica psicológica. Como vimos, o cansaço no trabalho, que constitui um dos primeiros passos dos caminhos que levam a exaustão, pode vir acompanhado da perda das perspectivas de futuro afetando, assim, outras dimensões da vida, ou seja, a relação amorosa, as relações familiares, o lazer, os estudos etc.

A exaustão gerada nos contextos de trabalho, além de desestruturar os demais contextos da vida da pessoa pode chegar até o seu ponto máximo, que é constituir alguma psicopatologia tal como a Síndrome de Burnout. Esta é caracterizada por fadiga crônica, despersonalização, perda de perspectivas de futuro, portanto, sofrimento psíquico no seu mais alto grau. Antes de chegar a exaustão é recomendável procurar orientação psicológica ou a psicoterapia.

No inicio são apenas sentimentos de desconforto perante certos acontecimento que podem levar a preocupações maiores até provocar insônia, dificuldades de relacionamento com colegas de trabalho, gerando ansiedade, desagrado em estar naquele ambiente até chegar ao desejo de não estar mais lá ou de não suportar ter que ir para o trabalho todos os dias. As atividades corriqueiras e que antes eram prazerosas vão deixando de sê-lo, o que antes fazia com alegria ou com facilidade passa a ser de difícil execução, as noites de sono não são mais suficientes para o descanso, as atividades de lazer vão perdendo o sentido e não é mais divertido estar com a família, como os amigos etc. E assim, cada vez mais o (a) trabalhador (a) vai se sentindo exausto (a), fatigado (a), sem vontade de trabalhar, de estar com a família, de estar com os amigos. Sente vontade de dormir, de descansar, mas o fim de semana não é suficiente e a antecipação tudo logo continuará novamente é dolorosa, as vezes, desesperadora.

O (a) trabalhador (a) que vivência a exaustão e beira o desespero, comumente não diferencia o que é problema dele (a) e o que é problema da organização do trabalho, das outras pessoas no trabalho, do seu contexto de vida fora do trabalho. Confunde tudo e às vezes sente-se culpado (a), fracassado (a), porém, não perde a vontade de trabalhar, gostaria de voltar a ser como antes, por vezes, alegre, ativo (a). Porém, não consegue atender as exigências no trabalho que transcendem as suas capacidades, decorrendo daí a perda de função do trabalho em mediar positivamente as demais dimensões da vida. Em termos gerais, as atividades realizadas por quem vive do seu trabalho estão em função dos interesses exclusivo do capital a medida em que as pessoas estão subordinadas ao funcionamento da maquinaria e/ou dos processos e dos objetos perdendo as condições para as relações humanas de reciprocidade. Obviamente, para que esses impasses sejam resolvidos é necessário um envolvimento coletivo.

A psicoterapia, mesmo assim, pode auxiliar o (a) trabalhador (a), inicialmente, propiciando o esclarecimento sobre a sua própria experiência de cansaço, fadiga ou esgotamento, bem como o contexto em que ela ocorre ou ocorreu. Esta localização desenvolvida no processo psicoterapêutico deverá orientar, também, que resgate e encontre novas mediações necessárias para reestruturar sua vida e, inclusive, sua própria personalidade. E por fim, auxiliará no entendimento sobre suas possibilidades de superação do sofrimento, neste caso do âmbito do trabalho, contribuindo para que outras relações afetadas se restabeleçam. É esperado que a vida adquira sentido de novo e que novas possibilidades constituam o futuro.

Obs.: O quadro acima chama-se O grito de Edvard Munch, datado de 1893.


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